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Janete Lima, MDA
25/04/2016
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Os programas de compras públicas representam para a agricultura familiar o reconhecimento da capacidade de geração de valor, por parte de milhares de organizações produtivas, representando outros milhares de agricultores familiares e demais povos e comunidades tradicionais em todo o país, segundo o coordenador de Apoio à Comercialização da Secretaria da Agricultura Familiar (SAF), do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), Ígor Teixeira. Em entrevista, ele nos conta um pouco sobre a importância de se garantir o escoamento da produção.
Qual a importância de pensar a comercialização para a agricultura familiar?
A geração e as oportunidades de negócios para a agricultura familiar vêm sendo eixos estratégicos do MDA ao longo de sua trajetória. A inserção de milhares de agricultores familiares nos processos de comercialização tem dado a visibilidade que essas famílias sempre almejaram no meio rural. Além disso, garantem a geração de renda e abertura de novas oportunidades, na medida em que ocorre a inserção da produção familiar, em mercados de compras públicas, como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae).
É notável a relevância do tema da comercialização para a agricultura familiar. O assunto é pauta recorrente nas manifestações das entidades representativas do setor e dos movimentos sociais rurais. A questão também está sempre presente nas agendas do Grito da Terra, da Marcha das Margaridas, das reinvindicações da Via Campesina, da Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar (Fetraf) e de outras mobilizações sociais rurais, realizadas ao longo do ano.
É inegável a importância de programas e políticas públicas de comercialização para a agricultura familiar. Estes programas e políticas públicas de comercialização devem estar articulados com as ações de fomento à produção, a exemplo do crédito e das políticas de Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater). A sustentabilidade e o sucesso de medidas de apoio à comercialização dependem fundamentalmente da conexão e sinergia entre essas três políticas.
Qual o papel dos programas de compras públicas para a agricultura familiar?
Na prática, os programas de compras, criados a partir de 2003, demonstram o aprendizado de mercado que muitas organizações e agricultores familiares necessitavam, para dar visibilidade e colocar seus produtos na rota de comercialização e consumo, sobretudo no segmento de compras governamentais, via PAA e Pnae. Além de gerar capital social e econômico a esses empreendimentos, estes programas têm garantido um potente círculo virtuoso ao injetar milhões de reais nas economias locais de milhares de municípios brasileiros.
Esses programas têm estimulado também a aquisição de produtos orgânicos, agroecológicos e saudáveis, mudando hábitos de consumo e gerando transformações positivas em antigos e tradicionais processos de compras, que impediam e alijavam a participação da agricultura familiar.
Para se ter ideia da dimensão do mercado de compras públicas aberto nos últimos anos, temos os seguintes dados:
- O PAA já foi responsável por adquirir cerca de R$ 6,4 bilhões em alimentos da agricultura familiar, de todo o país, de 2003 a 2015, beneficiando em torno de 1,6 milhão de agricultores familiares neste período. Já o Pnae adquiriu de 2009 a 2014 cerca de R$ 2 bilhões em alimentos da agricultura familiar e suas organizações fornecedoras.
- Apenas no ano de 2014, foram adquiridos da agricultura familiar, por meio dos mercados de compras públicas, o equivalente a R$ 1,3 bilhão.
- Este mercado ganhou reforço, a partir de 2015, com a publicação do Decreto nº 8.473, de 22 de junho de 2015, que estabeleceu percentual mínimo de 30% na aquisição de produtos da agricultura familiar e suas organizações pelos órgãos da administração pública federal.
De modo que o conjunto de canais públicos de compras disponíveis para a agricultura familiar (Pnae, PAA, legislações estaduais de compra e o Decreto Federal) apresenta um potencial estimado de aquisições de R$ 5,5 bilhões por ano.
Há políticas para trabalhar também a comercialização para mercados privados?
Sim. O MDA possui um conjunto de ações de apoio à promoção comercial e à participação em feiras e eventos nacionais e internacionais. No entanto, é necessária a união de esforços, no sentido de potencializar iniciativas existentes no próprio Ministério ou em órgãos parceiros. Tais ações devem apoiar outras formas de acesso aos mercados privados, como as feiras livres, a comercialização direta ou mesmo instrumentos que auxiliem as organizações da agricultura familiar na comercialização junto a mercados varejistas. Há importantes experiências, em nível local e estadual, de acesso a mercados privados. Os próprios agricultores familiares estabelecem como estratégia principal a venda da produção ao pequeno varejo e às feiras locais, fortalecendo circuitos curtos de comercialização direta de produtos em grande parte agroecológicos.
Uma das prioridades do MDA neste momento é a produção de alimentos saudáveis. Como isso é trabalhado nos programas de comercialização?
Com o reconhecimento da produção agroecológica e diferenciada. Nos programas de compras públicas, nos quais o MDA exerce importante protagonismo na formulação, no aperfeiçoamento e sobretudo na organização da oferta tem como uma de suas marcas a valorização de produtos orgânicos e agroecológicos. O PAA, por exemplo, desde 2003, admite um diferencial de preços de até 30% para os produtos comprovadamente orgânicos dos projetos apresentados à Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). No mesmo sentido, a legislação do Pnae referente às aquisições de produtos da agricultura familiar sugere ao gestor das compras que priorize a aquisição de produtos orgânicos e agroecológicos.
Podemos, portanto, atribuir ao mercado de compras públicas, construído e estimulado nesse período, o aumento e visibilidade da produção orgânica e agroecológica. No entanto, muitos desafios ainda precisam ser superados para ampliar a comercialização e o acesso por parte dos consumidores a estes alimentos saudáveis, reconhecidamente da agricultura familiar. Há importantes sinalizações neste sentido, colocadas na estratégia do MDA, de priorizar a produção de agricultores agroecológicos, em transição, e mesmo orgânicos. Isso pode ser visto nas ações de Ater e, mesmo em iniciativas para a redução do uso de agrotóxicos, por exemplo.
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