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Marcelo Pimentel
24/08/2012
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Quando os portugueses chegaram aqui, a mandioca ou aipim, ou ainda macaxeira, dependendo da região, já era cultivada em quase todo o território brasileiro. Cinco séculos depois, ela ainda continua sendo a cultura mais popular em nossas lavouras. Contudo, apesar de sua importância no hábito alimentar do brasileiro, a pesquisa e a distribuição de variedades melhoradas ainda é um desafio.
As dificuldades vão desde a condução de ensaios em rede, que dificultam a seleção de materiais com potencial para serem mais largamente empregados nas diferentes condições de clima e solo do país, até a mesmo à multiplicação das manivas (hastes para o plantio) das novas variedades nutricionalmente mais interessantes.
De acordo com o pesquisador Vanderlei da Silva Santos, melhorista da área de mandioca da Embrapa Mandioca e Fruticultura, no caso das espécies que produzem sementes, como soja, milho, arroz etc. há empresas nacionais e multinacionais que trabalham exatamente para atender a necessidade de sementes do mercado. No caso da mandioca, não existe mercado de manivas. A inexistência dessas empresas coloca toda a responsabilidade pela multiplicação dos materiais na própria instituição de pesquisa, o que torna mais lenta a difusão das novas alternativas e, na razão direta, avanços gerais para a cultura.
Desinteresse de empresas em multiplicar manivas é fator limitante para que materiais melhorados ganhem espaço
“Temos dificuldades em atender o mercado. Distribuímos manivas para todas as pessoas que nos solicitam por carta ou e-mail, mas fornecemos quantidades pequenas, para apenas dez plantas. Essa é a principal razão para que as cultivares melhoradas demorem a ser adotadas pelo mercado”, diz o pesquisador da Embrapa.
Dona de casa
Outro ponto de estrangulamento são os fundamentais trabalhos de seleção de materiais adaptados às diversas características edafoclimáticas do Brasil. Como não há redes de ensaio, o que se busca é apenas o desenvolvimento de variedades que atendam a um padrão mais genérico das diferentes peculiaridades de clima e solo das regiões, ao invés de se buscar a seleção e melhoramento de cultivares específicas para cada situação geográfica.
Segundo o pesquisador, até pouco tempo, a mandioca era uma cultura marginalizada, relegada a segundo plano, com pouco investimento e pouca gente trabalhando na área. O quadro gera reflexos sentidos até pela dona de casa.
“Por conta do lançamento de novas cultivares e veiculação na mídia, recebemos pedidos de manivas para diversas localidades do país, muitas onde os materiais não foram testados. O resultado é que surgem reclamações como problemas de não cozimento como deveria e, por se tratar de mandioca de mesa, esse tempo é fundamental. Mas se ficarmos esperando as condições ideais para o lançamento dos materiais, não vamos lançar nunca”, revela Santos.
Segurança alimentar
Em 2009, a Embrapa Mandioca e Fruticultura, lançou no mercado a BRS Jari, uma cultivar de mandioca mais rica em vitamina A em função do maior teor betacaroteno, com cerca de 9 ppm. Nada que se compare, por exemplo, à abóbora ou à batata doce, cujos teores podem chegar a 200 ppm. Mas em se falando da cultura mais popular do país, fala-se também de um consumo muitas vezes maior que o da batata doce ou da abóbora.
Mandioca de mesa, a BRS Jari foi lançada em 2009 e possui teor de betacaroteno mais elevado que as demais cultivares
A importância é estratégica do ponto de vista da segurança alimentar. A falta de vitamina A abre porta para diversas doenças na população, uma vez que auxilia, entre outras coisas, no aumento da imunidade do organismo humano.
“A mandioca mansa é consumida em quantidades muito maiores, daí a importância para aumentar o fornecimento de vitamina A à população, sobretudo, para a população de mais baixa renda que é a que mais sofre com os problemas de saúde decorrentes desse déficit nutricional”, destaca o pesquisador.
Atualmente uma das frentes de trabalho do BioFORT, o projeto responsável pela biofortificação de alimentos no Brasil, coordenado pela Embrapa, é o desenvolvimento de materiais de mandioca com 15 ppm de betacaroteno.
Além da elevação dos teores de vitamina A, o programa quer aumentar também os níveis de ferro e zinco na dieta da população mais carente. Por sua penetração junto à população. A elevação de teores de nutrientes ganha importância ainda maior quando percebidos dentro do contexto da alimentação escolar.
Vanderlei Santos, preocupação com o incentivo à pesquisa na mandiocultura
Mercado
A outra frente de trabalho das pesquisas diz respeito a cultivares de mandioca de mesa mais interessantes para o mercado. Santos explica que a sociedade hoje procura alimentos mais saudáveis e nutritivos, mas não só isso, mais práticos também.
“Antigamente a mandioca era comprada apenas nas feiras, naquela forma de raiz inteira. O mercado começou a buscar apresentações mais práticas, de preferência que a mandioca já venha limpa, descascada, embalada a vácuo e até pré-cozida. Mais recentemente, surgiu a necessidade de que ela já venha no formato chips ou sob a forma de bolinhos. Mas para que isso se desenvolva, mais investimentos em pesquisa são necessários”.
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